domingo, 22 de março de 2009

DEUS NÃO POUPOU SEU FILHO...

Deus não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós.

Deus não chegou ao ponto de entregar seu Filho? E tu não podes sequer dar do teu pão, a quem se entregou e morreu por ti? O Pai, por tua causa, não quis poupar seu verdadeiro Filho! E tu o deixas, com indiferença, morrer de fome, quando não farias mais que dar-lhe dos seus próprios bens, e para teu próprio lucro.
Ele se entregou por ti, por ti deixou-se matar, e por ti sai agora mendigando: o que lhe dás, para ajudá-lo, de seus próprios bens o tiras, e mesmo assim, não lhe dás nada! Pois não se satisfez somente em suportar a cruz e a morte; quis ainda conhecer o exílio, ser peregrino e nu, ser lançado na prisão e nada poder, para assim lançar-te o apelo: “Se tu me queres retribuir o mesmo que sofri por ti, tem piedade de mim por causa da minha miséria, deixa-te comover por minha enfermidade e prisão. Se não me queres pagar na mesma moeda, atende ao meu modesto pedido: eu não te peço nada que te custe; somente um pão, um teto e algumas palavras de conforto.
Se continuas insensível, que ao menos o pensamento do reino celeste e das recompensas prometidas te tornem melhor! Não queres levar em conta tudo isso? Então, que o teu coração ao menos se comova, por simples instinto natural, ao ver-me nu. Lembra-te da nudez que eu sofri na cruz por causa de ti. Por tua causa fui então algemado, e ainda o sou até hoje por tua causa. Por tua causa jejuei, e por tua causa ainda hoje passo fome. Senti sede quando estive suspenso na cruz, e continuo a senti-la nos pobres, a fim de atrair-te a mim e de tornar-te mais humano para tua própria salvação.
Assim, tendo-te obrigado por inumeráveis benefícios, peço-te agora que retribuas; não te peço, porém, como a um devedor, mas quero coroar-te como a um benfeitor e dar-te em troca desses pobres dons, o Reino.
Se estou na prisão, não te forço a me retirares de lá, quebrando minhas algemas. Só te peço uma coisa: veres que estou preso por ti; isto para mim será o bastante, em troca eu te darei o céu. Ainda que eu te tenha libertado de teus pesados grilhões, será bastante para mim que tu queiras visitar-me na prisão.
Eu poderia coroar-te sem tudo isto, mas quero ser teu devedor. Eis por que, podendo dispor de alimento, ponho-me a vagar como um mendigo e coloco-me à tua porta de mão estendida para ser alimentado por ti: eu te amo tanto! É por isto que eu desejo estar à tua mesa como entre amigos, e disso me glorio, e o proclamo diante do mundo, e a todo o universo me apresento como alguém a quem dás de comer.

S. João Crisóstomo, bispo: Homilias sobre a Carta aos RomanosHomilia 15, 6 in Epistolam ad Romanos(Patrologia Grega 60, 547-548)